porta quebrada

Esta página não tem intenção de ser reconhecida pelos "outros", mas serve de alívio para o que nela tenta escrever, rabiscando sentidos e percepções. Fadada ao caos do tempo alienado dos compromissos, aqui a mão e o cérebro se faz silêncio e palavra que perfura até o chão da rotina, ou seja, aquilo que deveria ser e não é mais. Por isso, neste espaço não existe porta, pois está quebrada, arrebentada pela liberdade do interesse.

domingo, 28 de março de 2010

Sentido Obrigatório!


Iniciou neste domingo a chamada "semana santa". Calma, não falarei de um acontecimento católico, ou algo do gênero da religiosidade habitual. Pergunto de início: donde provém o conceito de "santa"? "Santa" significa, saudável, ou seja, equilíbrio entre a confecção do possível e do tecido histórico velado que sempre nos escapa, até mesmo de nossas técnicas literárias, investigativas, artísticas e/ou plásticas. Sabemos que a vida é um meandro de terapias e loucuras. Somos loucos e encantados por sentido que buscamos nos outros. Uma navalha de conflitos internos e externos, típicos da razão que matematiza o coração. Eu, isoladamente em minha crença, escolhi a fatalidade das resoluções engendradas no meu peito e nos meus pés, que se tornam herança a cada passo dado e olhar depositado. Não me justifico em outras possibilidades, fora de mim, como um chapéu de carnaval, mas sim, justifico-me naquilo que me atravessa e posso misteriosamente apalpar. A Semana Santa é a soma de fatos aprofundados em uma linha histórica traçada por um homem, nada mágico e nem tão extraordinário, simples por demais, que foi até ridicularizado, fado típico dos anônimos, daqueles que não são artistas da massa e nem empresários de grandes bens. Enfim, primeiramente este homem foi aclamado como "necessário", "percebido", "vangloriado" com os ramos dos elogios e admirações. Num curto estender dos fatos foi desconfiado, mal falado e condenado; prostou-se não de medo, mas pelos escarros e palmatórias da moral local, codificada de forma medíocre pelo poder de mando. Jesus foi à imoralidade de uma proposta, a infidelidade da crença, (não de bandeiras e passeatas, mas de carne e encarnações) militante pela igualdade, tão massacrada pela falta de tantas coisas para muita gente. Este é o homem-símbolo, que mesmo morto fisicamente, justificou a sua vida na boca da memória. Abstenho-me da possibilidade da imaginação de uma fé cega e de tratados bem pensados, asseguro-me para este fenômeno apenas num fato: morto foi memorizado, explicado pelos que o seguiram em vida. A morte é a soma de lembranças daquilo que não perece: gestos, atitudes, falas de denúncias, perigos por uma causa, que se geometrifica sempre no outro. Eis o palco de uma semana diferenciada pela doideira cotidiana de dias e semanas, trafegadas de deveres e cumprimentos exigidos pela sobrevivência. Momento de deitar a mente e o corpo no pensamento daquilo que somos e profundamente somos interpelados a sermos. Mas existirá uma forma de conceber a vida de forma autêntica? Existirá uma essência para isto que chamamos VIDA? Estas questões será uma interrogação romântica ou meramente mais uma especulação filosófica, geradora de conceitos e palavras, como fábrica de isopor? Por vezes, na nossa diversificada rotina temos que encarnar a partir de rituais alguns fatos e comemorações, e desnudar assim, os sentidos destes meios e tempos que foram "criados" e "manuseados" sabiamente num belo dia de intenção. Assim, a intenção desta semana foi simples, apontar para a entrega daquilo que deixamos de ser. Hoje moralismos, templos, imagens de Deus (es) alienando a imagem natural da vida; exclusões, predileções, guetos, a-politicidade, partidarismos, prostituição, não do corpo, mas de julgamentos, se tornaram em ar no pulmão das relações. Neste cenário nasceu a história deste homem chamado de Jesus, uma resposta de contradição e subversão, transgressão para a ordem estéril, opressora do fenômeno vida. Vivemos num mundo de tantas ordens e decretos, em que a posse é direito, e não um crime, o poder é caminho e antídoto, e não abismo e doença. São estas situações que singularizam e reverenciam esta semana em momento de pensar em nós mesmos enquanto seres breves, marcados por uma vida de consumo de tempos e de cargas factuais que nos lançam para a vida ou a morte. Mas algo para lém disso?  Uma dica: para acontecer a ressurreição é necessária a dor da calúnia, do desprezo, da pobreza pelo desprezo, da não diplomacia diplomada, da inutilidade do servir, da idiotice da gentileza, da febre da generosidade. Jesus não é uma questão de fé, nem objeto de proselitismos, mas acontecimento de vida em meio há tantas mortes minúsculas, microscópicas, eterificadas e inconscientes no movimento habitual do que somos agora.