porta quebrada

Esta página não tem intenção de ser reconhecida pelos "outros", mas serve de alívio para o que nela tenta escrever, rabiscando sentidos e percepções. Fadada ao caos do tempo alienado dos compromissos, aqui a mão e o cérebro se faz silêncio e palavra que perfura até o chão da rotina, ou seja, aquilo que deveria ser e não é mais. Por isso, neste espaço não existe porta, pois está quebrada, arrebentada pela liberdade do interesse.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

nada o que é


Hoje tive um sonho, nada extraordinário, nem tão comum. Foi um golpe leve e certeiro na consciência de meus olhos e o resto do que chamo corpo. Como uma aparição de sentido e orientação intelectual. Vi Buda, sentado na terra feito raiz em mergulho aos extratos mais simples e naturais da terra. Rindo e mexendo-se de maneira jocosa e jovial, leve como pena na fazenda e alegre feito minhoca na floresta. Estava lá, sem trabalho, sem compromisso, sem desconforto psicológico, mental, físico, sem a ambição de um lugar de prazer desejável. Como uma árvore simples, num horizonte e espaço de vista sem grandes expectativas. Sem cenário conhecido de apetrechos e adereços próprios do que chamamos civilização (tribal, rural e/ou urbana). Neste lance de imagens surgiu um contraponto espontâneo. Imaginei de maneira dialogal a vida que levo e hei de levar frente a tantas expectativas e crenças “rídiculos”, “minúsculas” ou “profundas” e “grandiosas”. Entramos numa lógica que neste sono-sonho se evidenciou. Este pensamento e a premissa que ora iniciou é sutil, pois é comida, razão e ar existencial de nossos dias, enfim, o contrário é morte de tudo que afirmamos como vida. Ontologicamente somos feitos de uma coisa que a história de tantos homens e mulheres nos construíram e edificaram o que somos e queremos ser hoje e amanhã. Herdamos um espírito, um corpo viciado e uma mentalidade que nos posiciona e nos lança em movimento de tantas descobertas e conquistas – porém, todas fora e longínquas do eixo e do alvo do que somos realmente. A morte-defunto dos outros nos vêem feito agressiva verdade, pensamos do que vale tudo que temos e somos feito perante a objetiva e modal nadicidade da morte. Na morte nem as palavras do pastor padre e guia servem para alguma coisa. O Deus que pintamos virtualisticamente em nossa rotina neste momento não existe e nem tem razão de existir. Nossas entranhas de certezas seca, sem fertilidade de imagens e motivações. Nesta experiência que não escolhemos e somos postos frente ao chão real do processo natural da existência somos feito silêncio e pó. No velório até pensamos e vivemos isso de maneira intensa e espontânea, mas depois enterramos junto as nossas dores e a nossa natural consciência. Voltamos para os assuntos e critério dos vivos. Somos feito de nada em meio há tantas coisas e absurdos que não imaginamos mais como um apêndice e uma roda de diversão. Somos formigas com peso de elefantes. Somos uma soma de expectativas de consumir matérias, idéias, sentimentos e tantas e tantas projeções, projetos e coisas do gênero social e político que vivemos. O próprio trabalho digno que levamos e confessamos a cada dia é uma razão alienada, manipulada. A causa que luto de consciência política também nada mais é que exagero de enganação de um estado de deficiência e corrupção de capitalismo (enquanto armazenamento e fome insaciável) e poder (status insatisfatório, infinito, inacabável). Parar no não-fazer, no não-pensar resultará numa consciência simples, estranha, tola, imbecil, inútil, vagabunda,  mas libertária. Sair do movimento cotidiano do social e relacional existente, nos lança para um nada criador e integrador. Jejuar frente a esta cena é focar naquilo que seremos sem escolha ou crença. A existência circular se codifica numa outra lógica, sem as premissas carnificadas por o que hoje imaginamos e conscientemente somos.